MP pede afastamento de vereadores por suspeita de corrupção

Justiça havia mandado promotoria avaliar a aplicação de medidas alternativas previstas no Código Penal para crimes cometidos sem violência

O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) negou, nesta quarta-feira (20), a possibilidade de acordo para evitar uma ação penal contra os vereadores da Serra denunciados por corrupção. A Justiça havia dado cinco dias para que o órgão se manifestasse, antes de decidir se aceita a denúncia.

Os vereadores Saulinho da Academia (PDT), presidente da Câmara; Cleber Lima Pereira (MDB); Wellington Alemão (Rede); e Teilton Valim (PDT) são apontados pelo MPES como integrantes de um esquema de propina, que chegaria a R$ 100 mil para os envolvidos, para aprovação de um projeto de lei encaminhado pela prefeitura em 2024. Dois outros ex-vereadores, Luiz Carlos Moreira, presidente do MDB na Serra, e Aloísio Ferreira Santana, também são citados como mediadores das negociações irregulares.

O pedido para que o MP avaliasse a possibilidade de um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) foi feito pelo juiz da 2ª Vara Criminal da Serra, Gustavo Grillo Ferreira, na última segunda-feira (18). Na resposta do MP à solicitação, a promotoria de Justiça afirma que o acordo não é suficiente para reprovação e prevenção do crime, diante da gravidade dos fatos.

Entre os motivos listados para negar o ANPP está a ausência de “confissão formal” dos denunciados, o que seria um requisito primário para a oferta de acordo. Segundo o MP, Cleber, Saulo, Teilton, Alemão, Luiz Carlos e Aloísio negaram qualquer envolvimento em esquema de corrupção.

“O Ministério Público tem que ser coerente com a manifestação que requereu o afastamento cautelar daqueles de suas funções públicas”, afirma a promotoria na manifestação, a respeito do pedido de que os vereadores sejam retirados do cargo imediatamente.

Os indícios de crime são descritos pelo MPES com base em um áudio de uma reunião entre os denunciados, em que eles teriam negociado vantagens indevidas (ouça abaixo):

https://cdn.jwplayer.com/previews/YvWlBDcs

Com exceção de Teilton, todos os vereadores citados integram a Mesa Diretora da Casa. O pedido de afastamento leva em conta indícios de corrupção passiva — crime que se caracteriza quando um agente público solicita, recebe ou aceita promessa de vantagem indevida em razão do cargo. Segundo a denúncia apresentada à Justiça, anexada ao requerimento, os parlamentares teriam solicitado e aceitado promessa de vantagem indevida no primeiro semestre de 2024. O caso provocou indignação e um protesto foi realizado nesta quarta, na Câmara.

Já os ex-vereadores Moreira e Santana foram denunciados porque teriam intermediado interesses de um empresário para construção de uma clínica e seriam os responsáveis pela promessa de pagamento. A denúncia não cita o empresário envolvido no suposto esquema.

Para o MPES, o afastamento dos vereadores é necessário porque as condutas investigadas guardam relação direta com o exercício dos mandatos. Dessa forma, o pedido tem objetivo de prevenir que os parlamentares continuem a cometer irregularidades ou atrapalhem as investigações.

A promotoria, em sua manifestação para a Justiça negando o acordo, destaca que, além dos motivos legais, ainda existe o moral: “a vantagem indevida pretendida pelos denunciados, ainda não trate de dinheiro público, é decorrente diretamente das funções por eles exercidas.”

Ex-parlamentar é suspeito de participar de esquema de propina
Ex-vereador Aloísio Santana é denunciado em investigação do MPES Crédito: Reprodução

Entenda a denúncia

O caso gira em torno do projeto de lei 69/2024, enviado pelo então prefeito da Serra, Sergio Vidigal (PDT), à Câmara, visando regularizar imóveis urbanos de propriedade do município. O foco do projeto era que pessoas com domínio útil de imóveis da prefeitura pudessem legalizar a posse. Vidigal não está implicado na denúncia.

Antes de ser aprovado, no entanto, o projeto recebeu duas emendas, inseridas por um dos parlamentares, que ampliavam a lista de imóveis que poderiam ser regularizados.

Luiz Carlos Moreira é citado pelo MPES como um dos principais interessados no andamento da proposta, que chegou a ser conhecida como “Projeto do Moreira”.

Ministério Público denunciou e pediu afastamento de vereadores
Ex-vereador Luiz Carlos Moreira é citado em denúncia Crédito: Reprodução

O projeto começou a tramitar na Câmara em 7 de março de 2024. Em 27 de maio, o plenário aprovou, por 18 votos a 4, um pedido da prefeitura para que a matéria tramitasse em regime de urgência. Essa votação durou um minuto. No mesmo dia, o texto foi aprovado por 19 votos a 3, com uma abstenção, em votação que durou quatro minutos.

Já em 20 de junho de 2024, o próprio prefeito Vidigal enviou mensagem de veto ao projeto, alegando que as emendas anexadas ao texto estavam em desacordo com princípios constitucionais, como a separação de Poderes e a obrigatoriedade de licitação. Entre elas, estava uma emenda atribuída a Wellington Alemão, que, segundo o MPES, estaria ligada à suposta tentativa dos denunciados de obter vantagens indevidas.

Negociação foi gravada

Ainda conforme o MPES, a apresentação das emendas por Alemão, no mesmo dia da votação, teria despertado suspeitas dos outros vereadores. Em uma reunião horas antes da votação, gravada e usada como prova, os vereadores Saulinho e Cleber questionaram o colega sobre a alteração.

Nos áudios, segundo a denúncia, o grupo discute se deveria votar ou não o projeto e a emenda, manifestando insatisfação com a “vantagem ilícita oferecida”. Em um dos trechos, transcrito fielmente como fala o interlocutor, a voz atribuída a Cleber diz:

“Você chegou com uma ‘emendazinha’ aí e a gente tá sabendo o seguinte, e esse mesmo cara que você conversou, que iria dar uma situação para a galera aí, o cara recuou e você meteu uma emenda. Aí a gente quer saber o que que tem nessa emenda aí pros vereador votar não ter problema, mas é o miguelai (sic) cair pra todo mundo.”

Cleber da Serrinha, de acordo com denúncia do MPES Vereador

Para o MPES, a fala indica que Alemão teria negociado o recebimento de vantagem para ele mesmo ou para o grupo, e que havia interesse em que essa propina fosse dividida preferencialmente em dinheiro.

A denúncia também aponta que Alemão, considerado o “porta-voz” do empresário Aloísio Santana, que oferecia o pagamento, explicou que a proposta inicial era de R$ 100 mil, mas que havia sido substituída por um terreno de 6.000 metros quadrados na Praia de Carapebus, também na Serra. Essa mudança teria desagradado os demais vereadores. Apesar disso, a emenda foi aprovada.

Indícios de negociação em outros projetos

O Ministério Público do Estado do Espírito Santo afirma que o áudio, analisado pela Polícia Civil, além de registrar formas de recebimento da suposta vantagem ilícita na aprovação do projeto sobre regularização fundiária, também traz indícios de irregularidade na aprovação de outras matérias pela Câmara da Serra.

“O conteúdo também aponta, segundo a apuração, tratativas semelhantes em outros projetos relevantes, como o Plano Diretor Municipal (PDM) e o Projeto de Lei nº 620/2025, sugerindo risco concreto de novas práticas criminosas”, afirma o MPES.

O Projeto de Lei nº 620/2025, citado na nota do MPES, refere-se à “instituição de instrumentos de aplicação de política de desenvolvimento urbano no âmbito do Município da Serra”. De autoria do atual prefeito, Weverson Meireles (PDT), a matéria foi enviada à Câmara em 15 de abril deste ano. A última tramitação ocorreu em 29 de maio, em que é sinalizado que o texto aguarda parecer da procuradoria da Casa.

Os vereadores e ex-vereadores foram procurados pela reportagem de A Gazeta, desde o dia 14, quando o MPES pediu o afastamento dos parlamentares, mas eles não se manifestaram sobre o assunto. O espaço segue aberto para a defesa.

(DA REDAÇÃO \\ Beatriz Fontoura)

(INF.\FONTE: A Gazeta \\ Divulgação)

(FT.\CRÉD.: CMS/ Divulgação \\ Divulgação)