Aracruz, Baixo Guandu, Colatina, Marilândia e Sooretama decidiram não aceitar o acordo de R$ 656 milhões para reparação de danos ambientais, optando por aguardar o desfecho do processo na Justiça inglesa, onde buscam uma compensação digna pelos prejuízos sofridos
As cinco prefeituras que tinham até esta quinta-feira (6) para se manifestar sobre a adesão ao Acordo de Mariana decidiram recusar a proposta e aguardar a conclusão do julgamento do caso na Inglaterra. Aracruz, Baixo Guandu, Colatina, Marilândia e Sooretama, juntas, abriram mão de pouco mais de R$ 656 milhões, a título de reparação para os danos causados pelo rompimento de uma barragem de rejeitos de minério da Samarco, em Mariana (MG), em 2015, que atingiu o Rio Doce até o litoral do Espírito Santo, na expectativa de a Justiça inglesa conceder valor superior.
A indenização prevista no acordo referia-se à parte destinada a cada município e deveria ser paga em 20 parcelas – a primeira delas em abril deste ano –, conforme decisão mais recente da empresa. E ainda recursos de ações de reparação e compensação previstas para serem executadas pela Samarco, que estavam em andamento. Mas, para receber esse dinheiro, uma das cláusulas do acordo seria desistir da ação na Inglaterra. A exigência está prevista na repactuação, homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 6 de novembro do ano passado.
Pelo texto do acordo, a distribuição do dinheiro do acordo seria da seguinte forma:
- Aracruz – R$ 144,4 milhões (acordo)
- Baixo Guandu – R$ 95.736.979,09 (são R$ 79 milhões do acordo e mais R$ 16,7 milhões da Samarco)
- Colatina – R$ 292.825.790,83 (são R$ 267 milhões do acordo e mais R$ 25,8 milhões da Samarco)
- Marilândia – R$ 40,2 milhões (são R$ 39 milhões do acordo e mais R$ 1,28 milhão da Samarco)
- Sooretama – R$ 83 milhões (são R$ 79 milhões do acordo e mais R$ 4 milhões da Samarco)
O prefeito de Baixo Guandu, Lastênio Luiz Cardoso, já havia se manifestado, desde o final do ano passado, contrário ao Acordo de Mariana. Nesta quinta-feira (6), reafirmou seu posicionamento, após uma reunião com vereadores para esclarecer os motivos da recusa.
Para o prefeito, a Justiça brasileira apresentou o acordo após ser pressionada com o encaminhamento da ação na Inglaterra mais favorável aos municípios. Entretanto, ele afirma que a proposta daqui não atende aos interesses da cidade, tanto pelo valor quanto pelas condições de pagamento parcelado. Se a Justiça inglesa conceder o que foi pedido, Baixo Guandu terá direito a cerca de R$ 500 milhões, isto é, uma indenização cinco vezes maior do que a prevista no Acordo de Mariana.
Lastênio Cardoso admite que a Inglaterra pode decidir por um valor mais baixo, mas, ainda assim, ele acredita que será superior ao determinado pela Justiça brasileira. E se, por algum motivo, o entendimento for por não pagar indenização aos municípios, o prefeito reflete que o governo do Estado também deverá repartir com as cidades afetadas pelo desastre o que couber ao Espírito Santo.
Questionado sobre o prazo de julgamento, que poderia se estender por muito tempo, Lastênio aponta que a Justiça inglesa está em fase de conclusão do processo e a previsão é que, entre junho e julho, já possa haver uma decisão definitiva, com perspectiva de pagamento à vista ou, se a empresa não tiver condições de quitar a indenização, deverá pagar pelo menos 20% inicialmente, valor que, no caso de Baixo Guandu, já seria toda a indenização antes prevista no Acordo de Mariana.
Em nota, a Prefeitura de Aracruz afirmou que, após análise cuidadosa e considerações sobre os impactos e condições do Acordo de Mariana, decidiu não aceitar a proposta.
“A decisão foi tomada com base em critérios técnicos e jurídicos, levando em conta o melhor interesse da comunidade aracruzense, a preservação do meio ambiente e a busca por uma reparação que atenda de forma justa e eficaz as necessidades da nossa população, em especial as comunidades mais afetadas pelos impactos ambientais e sociais causados pela tragédia.”
Também por nota, a Prefeitura de Marilândia ressalta que optou por não assinar a repactuação por não concordar com os termos estabelecidos.
“A ausência de uma consulta prévia aos municípios para a discussão desses termos é um ponto crítico. Além disso, o valor proposto é considerado insuficiente, especialmente quando dividido ao longo de 20 anos, configurando um descaso com o município.”
Em virtude disso, segue a nota, a prefeitura disse que “continuará confiando nas ações judiciais em andamento, com destaque para a ação inglesa, na qual foram, de fato, discutidos sobre os danos causados, e que representa uma oportunidade legítima de reparação.”
A Prefeitura de Sooretama também ressalta que não aderiu ao Acordo de Mariana por não concordar com os termos, os valores e os prazos de pagamento definidos pela mineradora Samarco para indenização total dos danos coletivos causados ao município.
“A decisão foi tomada nesta quinta-feira (6), em comum acordo pelo Poder Executivo e a Câmara Municipal, através de comissão de parlamentares constituída especificamente para debater o tema, sob a orientação da procuradoria jurídica do município”, diz a prefeitura, em nota.
A administração municipal acrescenta que optou por seguir com as ações movidas nas cortes inglesa e holandesa, nas quais espera alcançar valores e condições mais justas de indenização para reparação dos danos sociais e econômicos sofridos em decorrência do desastre de Mariana.
“Vale reforçar que a decisão do município não impacta no pagamento de indenizações individuais, a pessoas físicas e jurídicas de Sooretama, através dos programas indenizatórios da Samarco previstos no Acordo de Repactuação”, conclui.
Em nota assinada pelo prefeito Renzo Vasconcelos, a administração de Colatina informa que permanece no polo ativo da ação movida na justiça inglesa.
Assim como Sooretama, aponta que a manutenção de Colatina nessa ação internacional não interfere nos processos individuais movidos pela população, tampouco prejudica o ingresso dos atingidos nas plataformas disponibilizadas pela Fundação Renova/Samarco.
“Dessa forma, os atingidos elegíveis ao recebimento de indenizações individuais devem buscar auxílio jurídico junto aos advogados e/ou defensores públicos aptos a representá-los perante os sistemas de indenização existentes.”
Ainda em nota, o prefeito frisa que, após uma análise técnica, a administração entendeu que a proposta de repactuação não atende aos anseios e necessidades do município. “Além de o valor ofertado ser muito inferior ao pretendido na ação inglesa, a forma de pagamento (em 20 anos) inviabiliza a correta aplicação dos recursos em ações concretas e emergenciais nas diversas áreas impactadas”, diz a nota.
“Por fim, ressaltamos que a decisão de permanecer na ação inglesa visa única e exclusivamente assegurar uma reparação financeira justa e suficiente, permitindo a aplicação estratégica dos recursos nas diversas áreas de atuação do município, em benefício de toda a população”, sustenta Renzo Vasconcelos no documento.
Ao contrário desses municípios, seis cidades aceitaram a repactuação: Anchieta, Fundão, Serra, Linhares, Conceição da Barra e São Mateus. A tragédia em Mariana ocorreu em 2015 e matou 19 pessoas atingidas pelo rompimento da barragem. Os dejetos seguiram por rios próximos, como o Doce, e prejudicaram mais de 40 cidades no Espírito Santo e em Minas Gerais.
Na quarta-feira (5) o ministro do STF Flávio Dino decidiu que os municípios atingidos pelo rompimento da barragem em Mariana não podem mesmo usar verbas indenizatórias para encargos, descontos, taxas e honorários, “a não ser os porventura previstos ou autorizados” pela Corte. “Os recursos que eventualmente os municípios venham a receber em face da adesão ao acordo homologado pelo STF, no âmbito da PET 13157, pertencem exclusivamente e integralmente aos patrimônios municipais”, citou o ministro.
O escritório Pogust Goodhead representa 620 mil vítimas na ação contra a Samarco e suas controladoras, a Vale e a BHP Billiton, na Justiça inglesa. Aponta que os valores de indenização podem chegar a R$ 230 bilhões. Para as 49 cidades presentes no litígio é estimado que recebam R$ 52,4 bilhões, pagos à vista, quase nove vezes o valor de R$ 6,1 bi previstos na repactuação brasileira.
(DA REDAÇÃO \\ Beatriz Fontoura)
(INF.\FONTE: A Gazeta \\ Aline Nunes/Vilmara Fernandes)
(FT.\CRÉD.: A Gazeta \\ Carlos Alberto da Silva)